*Nota
do editor: Pena
de morte é um assunto polémico, mas importante, em especial, diante
da situação violenta de nosso país. Para que você possa refletir
sobre a temática, trazemos dois artigos, um
a favor e outro
contra. Eles foram escritos tendo em vista o contexto
norte-americano, mas as argumentações buscam ser enraizadas na
Escritura. Independente de sua posição, é sempre bom considerar a
argumentação do outro lado. Esperamos que você seja edificado ou
desafiado com a leitura.
A
pena de morte faz parte da sociedade humana há milénios entendida
como a punição definitiva para os crimes mais graves. Mas deveriam
os cristãos apoiar a pena de morte atualmente, especialmente à luz
das recentes controvérsias em torno dela?
Essa
não é uma simples questão de sim ou não. Por um lado, a Bíblia
claramente evoca pela pena capital no caso de assassinato
intencional. Em Gênesis 9.6, Deus disse a Noé que a penalidade pelo
assassinato intencional seria a morte: “Se alguém derramar o
sangue do homem, pelo homem se derramará o seu; porque Deus fez o
homem segundo a sua imagem”. A pena de morte é explicitamente
fundamentada no fato de que Deus criou cada ser humano
individualmente à sua própria imagem e, portanto, um ato de
assassinato intencional é um ataque à dignidade humana e à própria
imagem de Deus. Aquele que intencionalmente tira a vida por meio do
assassinato, perde o direito à sua própria vida.
No
Novo Testamento, em relação à autoridade (os que governam sobre
nós) o apóstolo Paulo instrui os cristãos de que “não é sem
motivo que ela traz a espada”. De fato, neste caso, o magistrado “é
o ministro de Deus, vingador, para castigar o que pratica o mal
(Rm.13. 4).
Por
outro lado, a Bíblia estabelece que deve haver um alto nível de
evidências para se impor a pena de morte. O ato de homicídio deve
ser confirmado e corroborado pelo testemunho ocular dos acusadores, e
a sociedade deve tomar todas as precauções razoáveis para garantir
que ninguém seja punido injustamente.
Enquanto
a pena de morte é permitida e até mesmo ordenada em alguns casos, a
Bíblia também revela que nem todos os que são culpados ou
cúmplices de assassinato devem ser executados. Basta lembrar os
relatos bíblicos de Moisés e Davi.
O
pensamento cristão a respeito da pena de morte deve começar pelo
fato de que a Bíblia prevê uma sociedade na qual
a pena capital pelo assassinato é às vezes necessária, porém deve
ser extremamente rara.
A
Bíblia também afirma que a pena de morte, correta e justamente
aplicada, terá um poderoso efeito dissuasivo. Em um mundo de
violência, a pena de morte pode ser considerada um “firewall”
necessário contra o crescimento de mais violência letal.
Visto
sob esta luz, o problema que enfrentamos hoje não é com a pena de
morte em si, mas com a sociedade em geral. A sociedade
Americana[i] está
rapidamente se conformando à cosmovisão secular, e o claro senso de
certo e errado que era o dom do cristianismo para a civilização
ocidental está sendo substituído por uma moralidade muito mais
ambígua. Perdemos a capacidade cultural de declarar que o homicídio
– mesmo o assassinato em massa – é digno de pena de morte. Nós
também roubamos, da pena de morte, o seu poder de dissuasão ao
permitir que casos de pena de morte venham enfraquecendo, por anos, o
sistema legal, por meio de apelos frequentemente baseados na
irracionalidade e irrelevância.
Além
disso, os cristãos deveriam ficar indignados pela forma injusta pela
qual a pena de morte tem sido frequentemente aplicada. Ainda que a
lei em si não seja prejudicada, a aplicação da pena de morte
muitas vezes é. Por exemplo, há poucas chances de que um assassino
rico seja executado. Porém, há uma probabilidade muito maior de que
um assassino pobre enfrente a execução. Por quê? Porque os ricos
têm condições de pagar equipes de advogados de defesa massivamente
caras que podem desaurir a capacidade da promotoria de obter uma
sentença de pena de morte mesmo quando o réu é claramente culpado.
Isso é um ultraje, e nenhum cristão deveria suportar tal
disparidade. Como a Bíblia adverte, as pessoas não devem poder
comprar a justiça por seus próprios termos.
Há
também o contexto cultural maior. Devemos reconhecer que nossa perda
cultural de confiança na dignidade humana e a secularização da
identidade humana tornaram o assassinato um crime menos hediondo na
mente de muitos Americanos. A maioria não admite essa avaliação
moral inferior do assassinato, mas nosso sistema legal é uma
evidência de que isso é certamente verdade. Note também que,
embora a maioria dos Americanos afirme acreditar que a pena de morte
deve ser apoiada, há uma grande variação na forma como os
Americanos de diferentes estados e regiões pensam sobre a questão,
evidenciando essa tendência de secularização.
Nós
também enfrentamos um ataque frontal à pena de morte movido por
ativistas legais e outros determinados a colocar um final às
execuções legais na América. Sua intenção é tornar a pena de
morte tão horripilante na opinião pública que o apoio às
execuções desapareceria. Eles têm atacado todas as formas de
execução legal com uma “punição cruel e incomum”, embora a
própria Constituição autorize a pena de morte. É um testemunho da
insanidade moral o fato de que eles tenham conseguido desviar a
atenção dos crimes hediondo de um assassino e colocar a pena de
morte em julgamento.
Eu
acredito que os cristãos deveriam esperar, orar e lutar por uma
sociedade na qual a pena de morte, correta e raramente aplicada, faça
sentido moral. Essa seria uma sociedade na qual todos os direitos do
acusado seriam protegidos e com toda garantia de que não seria o
status social do assassino que determinaria a sentença pelo crime.
Os
cristãos devem trabalhar para garantir que não haja qualquer dúvida
razoável de que o acusado é realmente culpado pelo crime. Devemos
orar por uma sociedade em que a motivação por trás da pena capital
seja a justiça e não apenas a vingança. Devemos trabalhar por uma
sociedade que honrará todos os seres humanos em todos os estágios
de desenvolvimento e de todas as raças e etnias feitas à imagem de
Deus. Devemos esperar por uma sociedade que apoie e exija a execução
da justiça a fim de proteger a própria existência dessa sociedade.
Devemos orar por uma sociedade que, corretamente, tempere a justiça
com misericórdia.
Os
cristãos deveriam apoiar a pena de morte hoje? Eu acredito que
devemos, mas com as considerações detalhadas acima.
Os
cristãos devem ajudar os seus concidadãos conduzindo-os ao
entendimento do que está em jogo. Deus afirmou a Noé que, por causa
da dignidade humana, a pena pelo assassinato seria a pena de morte.
Nosso trabalho é deixar isso claro aos nossos semelhantes.
–
[i] N.E.:
Este texto foi publicado pelo autor considerando o contexto e
noticiário americano, porém nós, do Voltemos ao Evangelho, cremos
que seu ensino geral é importante também para o nosso contexto.